1. A presença de uma figura singular;
  2. O amor humano;
  3. A Verdade como a única finalidade humana.

 

A presença de uma figura singular

 

Vamos imaginar o ser humano como um computador: o software, a mente e suas peculiaridades, e o hardware, o corpo físico propriamente dito, composto com órgãos e sistemas fisiológicos. A psique, do grego psykhé, seria a personificação da alma, ou seja, uma parte do software responsável por adaptar o nosso comportamento e nossas emoções. Contudo, assim como os roteiristas são totalmente dependentes de um personagem, a alma se faz presente em um corpo físico na qual ela possa ocupar. 

 

Antropologicamente, não podemos reduzir o ser humano à sua psique, uma vez que a presença de uma figura singular configura a grandeza da sua existência. A teologia nos diz que o homem é um reflexo da figura de Cristo que se realiza por meio do contato com outras criaturas até que elas se transformam pela natureza do amor, tornando-se indissociável à sua essência.

 

Vamos compreender como esses amores moldam uma unidade singular da nossa personalidade.

 

O amor humano

 

Para Platão, “Eros” era o conceito geral para um amor sensitivo, ou seja, um amor basilar, primitivo. A criança possui um amor destemperado, pois quando ela se coloca diante de algo que realmente ama, ela não consegue atingir um equilíbrio em sua temperança, uma vez que ela não tem uma vontade intelectual para ajudá-la a controlar a sua intensidade. Assim, ela aprende os primeiros passos da responsabilidade, descobrindo a alegria e o sacrifício que acompanham o ato de amar algo além de si mesma. Para a teologia, esse amor puro seria algo louvável, pois demonstra essa capacidade de se transformar em algo por amar tanto, ou seja, amar tanto a Deus a ponto de imitá-lo o máximo possível.

 

Já com o adulto, isso não acontece, pois ele possui personalidade e a sua capacidade de amar é temperada, pois a responsabilidade pelo próprio futuro, expressa através de escolhas educacionais e profissionais, reflete um amor mais maduro e comprometido com o desenvolvimento pessoal e o bem-estar dos outros.

 

O sacrifício e o compromisso tornam-se elementos essenciais na manutenção e no fortalecimento dos laços familiares e sociais, pois geram amores maiores. Os gregos também tinham um nome para esse tipo de amor - philia. Para nós, amizade. São Tomás de Aquino chamava de amar as mesmas coisas e repudiar as mesmas coisas de amizade.

 

O amor romântico e o casamento representam uma forma de amor mais profunda e duradoura, baseada no compromisso mútuo e na responsabilidade compartilhada. O casamento desafia os parceiros a amar um ao outro até a morte, promovendo uma união de interesses e valores compartilhados. A responsabilidade no casamento envolve não apenas o cuidado do parceiro, mas também a construção de um futuro em comum, marcado por sacrifícios e acordos.

 

Dentro da nossa relação com pessoas, nós somos temperados pela sua presença. Nos tornamos um pouco delas pelo próprio processo da presença de uma figura singular. A linguagem do amor pela presença. Dentre essas pessoas que vão convivendo conosco, vamos construindo amizades a ponto de perceber que para algumas durarem mais, eu preciso oferecer mais sacrifício e cultivar amores que geram outros amores superiores.

 

A Verdade como a única finalidade humana

 

Quando o ser humano começa a ter experiências com a philia, ele passa a procurar coisas mais duradouras que permita a percepção de uma verdade que permanece, nem que seja uma verdade simples. 

 

Retomando ao matrimônio, a experiência de uma promessa até a morte demonstra uma relação patrimonial do amor, uma ligação de vidas com a construção de uma família, uma herança. Mas, no decorrer dos anos, começamos a ver a deterioração do nosso corpo, se consumindo por doenças e até algumas experiências de quase morte, remetendo à morte como um alerta de que tudo está acabando.

 

Então qual seria a finalidade da nossa existência? Essa verdade que explica o sentido da vida perdura quando a morte se aproxima, ou seja, sempre ficamos presos e tentando buscar essas experiências que perpassam a humanidade e são constantes, são duráveis.

 

A teologia, portanto, traz uma tradição que nos faz efetivamente vencer a morte. Além da filosofia, uma vitória permanente sobre a morte, um caminho todo dos amores no amadurecimento humano e isso é muito importante para entendermos a antropologia humana.

 

Os amores de baixo precisam ser regados pelo amor e pelo próprio sacrifício para que ele vá frutificando como uma árvore que vai crescendo e se tornando um amor superior. Então, as árvores de cima têm essa característica, elas crescem e elas são árvores que dão frutos cada vez mais duradouros, mas que esses frutos também se sacrificam. Então, o fruto da árvore de cima ele se sacrifica para que o fruto da árvore debaixo cresça. Essa é a nossa finalidade, buscar o bem e esse bem é a Verdade.

 

Quando uma pessoa chega no amor ágape, aquela visão transcendental da morte, ela está buscando uma vitória sobre o fim da sua existência. E isso justifica o motivo da humanidade no seu ápice estar centrada na religião, cujo amor é expresso pelo ágape, porque, afinal, todos os dramas da nossa vida sempre se resumiram ao drama da morte, à doença, ao sofrimento.

 

Logo, a vocação do homem é construir amores perenes e toda a sua personalidade gira em torno desse eixo. Então, a substância da vida humana é: as pessoas vivem e se relacionam e vão subindo os degraus da natureza do amor.